Os Agostinianos Recoletos da Província de São Nicolau de Tolentino se propuseram nos anos cinquenta do século passado, a lançar suas bases em Madri. Sua história havia se desenvolvido nas Filipinas, embora nesse momento estivessem presentes também no México e na Inglaterra.
A residência
Dia 21 de junho de 1952 o Conselho Provincial aprova a fundação de uma residência em Madri. O prior provincial logo se transfere para a capital a fim de iniciar os trâmites de abertura da nova residência. Dia 12 de agosto se compra o terreno, um solar de 2.260 metros quadrados, situado em uma região estratégica, então em fase de urbanização, no bairro de Argüelles, nos limites da Cidade Universitária de Madri. O solar ocupava o ângulo formado pela Rua de Gaztambide e a ampla Avenida de Cea Bermúdez.
Já em janeiro 1953 começou a construção da ampla residência dos religiosos, de acordo com projeto dos arquitetos Antonio Vallejo Álvarez e Ramón Ramírez de Dampierre, que planejaram um edifício de amplas dimensões, com fachada plana, de ladrilho vermelho, com uma série de pequenas janelas dispostas geometricamente e emolduradas com granito cinza. Tudo isso, sem dúvida, inspirado nos edifícios da vizinha Praça de Moncloa e da Cidade Universitária, de linhas austeras e repetitivas reminiscências do estilo escurialense, com o cromatismo conseguido pelo contraste entre o ladrilho vermelho e o granito.
Evocava também, à distancia, o convento dos Recoletos situado no solar da atual Biblioteca Nacional, no Passeio que hoje leva seu nome (Paseo de Recoletos), e que a Ordem precisou abandonar após a desamortização de Mendizábal no século XIX.
O edifício plano e reto faz esquina com Cea Bermúdez, uma das mais expressivas avenidas da região. Enobrece-se tendo ao alto uma torre em cuja base há um nicho de pedra com frontão sobre um relevo esculpido por Antonio Martínez Penella. Este relevo representa o busto de Santo Agostinho como bispo e doutor; mais acima, a torre exibe um grande relógio e é coroada com um capitel de lousa rematado pela cruz.
O templo
A primeira pedra do templo foi solenemente assentada a 11 de janeiro de 1953 com a residência já terminada. O templo não está organizado a partir da fachada, mas do interior. No traçado de seu projeto se prescindiu de cruzes gregas e latinas, nem se pensou em um recinto típico de basílica.
A forma circular e a ausência de colunas e suportes deixaram-o funcional em seu sentido mais pleno: tendência concentradora. Aqui o altar, verdadeira mesa e pedra sacrifical, ocupa o lugar mais visível e significativo do templo. Trata-se de ver e ouvir ao sacerdote. Esta foi a linha estratégica: criação de um âmbito que eleve o espírito e prepare à oração, sem reflexos condicionados.
As obras da nova igreja duraram seis anos. Suas características técnicas exigiam bases bem fortes, e obedeciam tanto a causas estéticas (forma de cone truncado) como geográficas (características do terreno).
A fachada da igreja acompanha a linha do conjunto, formando um todo harmônico com o resto. A vida de Santa Rita está registrada em um grande retábulo. Os dezesseis adornos, incrustados sobre o ladrilho vermelho, ressaltam a brancura da pedra e estão encaixados em marcos da mesma pedra de Colmenar de Oreja.
Da esquerda para a direita e de cima para baixo vemos outras tantas cenas da vida da santa dos impossíveis. Assim, a fachada nos prepara, após esta ambientação de singela, mas profunda beleza, para entrar no recinto sagrado e adorar a Deus em sua grandeza através de uma de suas santas.
Desenho interior
Entramos na igreja. Um breve átrio liga a rua com o interior da igreja de Santa Rita de Madri. Ao se abrir as portas, somos tomados por uma profunda impressão, entre o assombro e a admiração. A verticalidade das paredes, a luz de variados matizes dos vitrais e a luminosidade azul da abóbada oferecem brilho e ligeireza.
Os arquitetos escolheram, como meio de sacralizar o espaço desde o primeiro instante, o assombro, um temor bem similar ao conseguido pelos templos bizantinos. O ritmo ascendente dos suportes e da luz matizada dos grandes lustres nos lança para o alto. Estas são de amarelo dourado ao meio-dia, violeta ao norte e vermelho ao leste. Mas, sobretudo, impressiona a luz zenital que envia uma cúpula quase plana e de um azul celeste que reflete a luz natural. Todo isso dota o ambiente de uma cálida luminosidade.
Um grande anel forma a base da abóbada que oferece em grandes letras de ouro a lateranense glorificação suprema à Santa Trindade: Gloria Patri et Filio et Spiritui Sancto. Sicut erat in principio et in saecula saeculorum. Amén. (Gloria ao Pai e ao Filho e ao Espíritu Santo. Como era no princípio e pelos séculos dos séculos. Amém).
As duas nervuras da estrutura, cobertas de mármore de cor dourado, e que se vão estreitando para o alto, formam oito espaços simétricos que marcam os espaços. No nível imediatamente inferior ao anel da doxologia trinitária, dando de novo toda a volta, encontramos, no espaço frontal, um mosaico com a representação da Trindade; e nos sete restantes, frases de Santo Agostinho sobre o sentido do templo, alternando com figuras do santoral agostiniano.
Nesse lugar superior e seguindo a direção dos ponteiros do relógio, ficam sete espaços onde estão inscritas sete sentenças de Santo Agostinho sobre o sentido sagrado do templo que se alternam, no espaço, com as oito figuras do santoral agostiniano. Nesta parte superior do cone truncado, Javier Clavo usou os espaços intercalados entre as frases de Santo Agostinho sobre o sentido do templo cristão para pintar um santoral agostiniano com fundos de cores escuras.
Descemos a um nível inferior. Logo nosso olhar é atraído pela gigantesca imagem de santa Rita, de quase cinco metros. Penella, seu autor, lavrou-a de forma sintética, com os traços essenciais, de corpo quase cilíndrico, a monja vestida de hábito negro e a cintura cingida pela correia agostiniana, abraçando a cruz em um gesto meditativo e amoroso, que não se sabe se sobe ao céu ou desce para atender às preces de seus devotos.
O altar
Abaixo, formando parte do presbitério, o altar tende a ser o centro da celebração, para o que se escolheu uma enorme pedra de mármore negro polido de Marquina, material também do ambão, lugar da proclamação da Sagrada Escritura, e que cobre todo o solo do presbitério.
Javier Clavo deixou também mostra de sua arte mosaica na via crucis, situada numa franja que cinge quase todo o círculo, a sete metros de altura. Aqui o artista optou por um estilo mais moderno, desprendido, expressionista; nesse mosaico reluz o melhor de sua capacidade inovadora e técnica.
As nervuras do edifício formam oito partes: a frontal ocupada pela parte do altar maior e, no lado oposto, as portas de entrada; o restante é composto de seis capelas de escassa profundidade e que se integram na visão de conjunto, cada uma delas com estilos distintos e complementares. Foram elaborados levando em conta os momentos em que cada sacerdote celebrava pessoalmente sua missa, sem que houvesse propriamente concelebração. Cada uma tem sua razão especial.
A cripta
A Província de São Nicolau de Tolentino, promotora da igreja de Santa Rita de Madri, quis dedicar a cripta, sobre a qual se eleva a igreja, a seu santo protetor. No átrio de entrada, à direita, se abre uma amplíssima porta que, por uma escada, conduz à cripta. Na parede da frente nos encontramos de novo com Nossa Senhora da Consolação, agora em pintura a óleo sobre tela de Juan Barba, o pintor do maravilhoso mural que recobre o anel da cripta.
Passado o patamar, seguimos descendo. Em um amplo espaço que precede a cripta, aparece, de repente, um impressionante Cristo crucificado, o chamado Cristo da Reconciliação. Sua visão pretende criar no visitante um ambiente de religiosidade que brota da morte de Cristo.
Deste mesmo patamar, girando à direita, surgem à nossa frente, em uma supremacia de cores e de luz, as pinturas de Juan Barba na cripta dedicada a são Nicolau de Tolentino. Vemos um Cristo crucificado, sem cruz, que emerge de um fundo cintilante. Sentimo-nos atraídos por uma estranha fascinação e avançamos para a cripta.
Mural
Um mundo sortido de figuras e de cores aparece em um impressionante mural de 32 metros de comprimento e 130 metros quadrados. Estão pintadas nas paredes da cripta, situada no mesmo centro, sob a igreja, que é uma perfeita circunferência de cinco metros e meio de altura no centro e três metros e meio nas paredes.
O mural seduz de imediato. As pinturas são projetadas à altura do espectador, com suas figuras maiores que o natural, como que rodeando o espectador; além disto, Barba utilizou uma técnica especial baseada em óleo, não em afresco tradicional, que dá à pintura seu intenso colorido, traços soltos e afrescos.
Arte religiosa
O final dos anos 50 e começo dos 60 foram tempos de forte polêmica na arte religiosa, que teve força na Espanha, nos países do centro da Europa, ao florescer a construção de novas igrejas após a Segunda Guerra Mundial. Para muitos, as soluções propostas como mais modernas copiavam demais a frieza e nudez dos templos protestantes; para outros, não fazia sentido continuar com um estilo estático, distante do sentimento de renovação litúrgica.
O jornal diário argentino “La Nación” apontou, em suas crônicas, que havia sido criada uma obra de grande força poética, conseguindo uma impressão de extraordinária grandeza. Uma revista especializada ressaltou o “ritmo novíssimo de uma estética cuja surpresa de modernidade não exclui a beleza solene devida à casa de Deus”.
O madrileno jornal diário “Ya” assinalou que era “um modelo do que deve ser uma igreja de hoje”, contrapondo seu estilo a tanta igreja do século XIX “repletos de adornos de gesso e imagens delicadas”, ressaltando o ambiente acolhedor da nova igreja. O jornal diário “Arriba” sentenciava: “Nunca vimos uma igreja tão moderna e bonita ao mesmo tempo; e destacava suas três características mais notáveis: “luminosidade, simplicidade e transparência”.
Frente a estas elogiosas opiniões, surgiram vozes altissonantes de defensores de uma arte mais moderna e rompente, mais de vanguarda, entre os que destacam o tratadista de arte sacra Juan Plazaola, jesuíta, e o dominicano Aguilar, diretor da revista “Ars”. Plazaola dirá que “o olhar tende a se dispersar, atraída pela variedade de revestimentos” e aponta detalhes anti-litúrgicos que em outros países já se havia corrigido. Por sua parte o padre Aguilar chegou a chamar de “bazar” à igreja de Santa Rita frente à nudez que propiciava.