A festa vinha sendo preparada desde o dia 4 de janeiro quando, para surpresa de todos, o bispo agostiniano recoleto José Luis Lacunza foi nomeado cardeal pelo papa Francisco. A data fixada para a imposição do barrete e demais distintivos cardinalícios era o 14 de fevereiro. No dia seguinte, domingo, seria celebrada uma eucaristia especial na basílica de São Pedro. Antes, nos dias 12 e 13, todos os cardeais da Igreja estavam convocados para seguir estudando o modo de levar adiante a reforma da Cúria romana.
14 de fevereiro, Consistório
Era um Consistório ordinário público, isto é, una reunião de todo o Colégio Cardinalício na que publicamente o Papa ia criar 20 novos cardeais. Ainda que na dinâmica da Igreja isto seja algo ordinário, para os agostinianos recoletos era uma ocasião completamente extraordinária, pois, nos seus 427 anos de história, nunca teve um cardeal. Por esta razão o Prior Geral convidou para participar do ato os outros 17 bispos da Ordem.
Por causa da iminência da data, nem todos os bispos recoletos puderam comparecer. Estiveram presentes os três do Peru (Emiliano Cisneros, Carmelo Martínez e Fortunato Pablo) e os dois da Colômbia (Javier Pizarro e Alejandro Castaños). Assistiram também os outros dois bispos recoletos do Panamá (José Agustín Ganuza e Aníbal Saldaña) e o emérito dos Estados Unidos (David Arias). Igualmente compareceu o auxiliar do México (Carlos Briseño), o mesmo que o da Espanha (Eusebio Hernández). Não puderam fazê-lo os cinco do Brasil (Javier Hernández, Joaquín Pertíñez, José Luis Azcona, Jesús Moraza e Jesús María Cizaurre), o da Costa Rica (Ángel San Casimiro) e o arcebispo Mario Molina, da Guatemala. Aos bispos presentes uniram-se cinco dos oito priores provinciais da Ordem, assim como sete companheiros de noviciado do cardeal eleito.
Também foram feitos convites aos outros dois priores gerais da Família Agostiniana: Alejandro Moral, da Ordem de Santo Agostinho, e Gabriele Ferlisi, dos Agostinianos Descalços. Os dois estiveram presentes, assim como a Superiora Geral das Servas de Maria.
A cerimônia do dia 14 de fevereiro foi realizada na basílica de São Pedro que estava completamente lotada. Os protagonistas eram, junto com o papa Francisco que presidia a celebração, 19 dos 20 novos cardeais, que junto com ele entraram em procissão já vestidos de vermelho púrpura. A cerimônia consistiu basicamente, primeiro, numa leitura do Hino da Caridade de são Paulo (1 Cor 12, 31-13, 13), seguida da homilia. Nela, o Papa apresentou a caridade como o caminho da Igreja e compromisso obrigatório de todo cardeal.
A seguir, os neocardeais fizeram a profissão de fé e juraram fidelidade e obediência ao Santo Padre. Depois apresentaram-se diante dele para ser-lhes imposto o barrete vermelho da sua condição e para receber o anel que representa seu amor especial à Igreja. Nesse momento, lhes foi anunciada a igreja romana designada a cada um como sede de seu título; no caso do cardeal Lacunza, foi-lhe encomendada a paróquia de São José de Cupertino, na zona da Laurentina. Faltava somente que os já constituídos no cargo de cardeais se incorporaram ao Colégio, aí presente em sua totalidade. A forma de fazê-lo foi mediante a saudação pessoal, um por um, aos dois centenares de purpurados, encabeçados pelo papa emérito Bento XVI, que não quis faltar nesta cerimônia tão significativa.
“Visitas calorosas”
Após uma celebração de pouco mais de uma hora, chegou o momento do almoço num restaurante próximo do Vaticano. Faziam parte da mesa de honra, junto com o neocardenal e o presidente do Panamá, Juan Carlos Varela, os outros dois cardeais centro-americanos, Óscar Rodríguez Maradiaga e José Leopoldo Brenes, além do cardeal Juan Bautista Re, que preza-se de antiga amizade com os agostinianos recoletos.
Re foi o primeiro em pedir a palavra pelo microfone para mostrar sua alegria e felicitar ao novel cardeal, ao Panamá e à Ordem. Fizeram o mesmo, a seguir, o Prior Geral e o presidente Varela. E, no final, falou o próprio Lacunza, fazendo um rápido resumo da sua vida, no qual agradeceu primeiro à sua família, e depois a seus irmãos recoletos e ao Panamá.
Teve que se ausentar com certa urgência porque estava na hora de começar “as visitas calorosas”. Isto é habitual no Vaticano, quando são empossados novos cardeais. É designado a eles um local concreto por onde passam todos aqueles que desejam parabenizá-los. Para Lacunza, e a maior parte dos outros cardeais, foi designado um lugar na aula Pablo VI. Lá, durante quase três horas, o Cardeal do Panamá atendeu sorridente e em pé a jornalistas, personalidades, religiosos, fieis e pessoas de todo tipo que não cessaram de passar felicitando-o, pedindo declarações, bênçãos e inclusive autógrafos. Eram 19 horas quando pode, finalmente, retirar-se, esgotado e feliz, à sua residência na Casa Santa Marta.
15 de fevereiro, Eucaristia
No domingo 15 de fevereiro estava programada na Basílica Vaticana a eucaristia presidida pelo Papa. Segundo especificava o folheto oficial, era a santa missa com os novos cardeais e o Colégio Cardinalício. Mais uma vez, a basílica estava lotada. Os bispos agostinianos recoletos, em bloco, madrugaram para ocupar o melhor lugar possível. E o resto dos frades buscaram também a melhor forma de encontrar um bom lugar: um deles na chamada “capela papal”, outros vários entre os presbíteros que distribuiriam a comunhão.
A liturgia correspondia ao sexto domingo do tempo ordinário. O evangelho de são Marcos (1, 40-45) narrava a cura de um leproso. Da condição de marginado desta pessoa serviu-se Francisco para completar seu ensinamento do dia anterior sobre a caridade, o ser da Igreja e a função do cardeal. Falou das “duas lógicas de pensamento e de fé: o medo de perder aos que estão salvos e o desejo de salvar aos que estão perdidos”. Insistiu mais uma vez dizendo que “o caminho da Igreja é sair do próprio recinto para ir buscar os afastados nas periferias da existência”. Aos novos cardeais insistiu dizendo que “a disponibilidade total para servir aos outros é nosso sinal distintivo, é nosso único título de honra”. E concluiu de modo contundente, exortando-os “a servir à Igreja de tal modo que os cristãos não tenham a tentação de estar com Jesus sem querer estar com os marginalizados, isolando-se numa casta que nada tem de autenticamente eclesial.